sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

Ruminações de uma noite qualquer (ou sobre como a vida era mais simples da forma que foi ensinada na escola)



Conversa com o marido em uma noite de segunda-feira:

Eu: Amor, acho que vou voltar para as aulas de inglês!

Ele (prático e sutil castrador): Voltar para as mesmas aulinhas de sempre, para quê? Para o seu nível (eu já havia terminado um curso de inglês na adolescência e, recentemente, havia retomado aulas em um curso regular, interrompidas porque haviam caído na mesmice), se quiser mesmo aprender inglês, há outras formas melhores!

Eu (lisonjeada e cabreira com o elogio): Vou fazer então uma imersão no Canadá ou Austrália!

Ele: Isso é bom, mas há outras formas mais "reais", a internet está cheia de ferramentas para melhorar seu inglês.

Eu: Acho que vou fazer então alemão ou francês!

Ele: Claro, junto com o curso de Direito, o Mestrado em Psicologia, e acrescente aí um mandarim ou russo também!

Pronto, ele, a mente mais linear e lógica que eu conheço, fazendo ali as vezes de um terapeuta eficazmente frustrador. E ali se deu o corte, ponto final para a conversa. Um pouco de adubo para minha mente imaginativa, ruminante que fiquei com aquele breve diálogo.

Por fim, encerrei com um suspiro e um desfecho que me é peculiar: Acho que tenho de viver uns duzentos anos para realizar tudo o que quero.

E então o diálogo passou a ocorrer em nível mental, em forma de reflexões. Será que perdi o foco? Por que essa minha mania de querer tudo ao mesmo tempo?

De repente vi uma imagem de mim mesma fazendo mil planos mirabolantes, fadados desde o início ao sabotamento. Porque é humanamente impossível dar conta de tudo. Ali vislumbro o adestramento a que estou submetida. Eu e todos os outros e outras que nos autodenominamos "modernos". Porque o mundo exige pessoas multitarefas, como um computador com várias "janelas" abertas ao mesmo tempo. Concentração demais virou "out". O "in" é fazer de tudo um pouco. Mesmo que isso obviamente gere alguns prejuízos, como ficar no nível raso, fora as sequelas de ordem psíquica, mas, aí são outros quinhentos.

A vida era bem mais simples da forma que me foi ensinada na escola: "O homem nasce, cresce, reproduz e morre".

Pronto, reproduzir era o ápice da existência humana. O grande ponto era garantir a continuidade da espécie. Ok, ok, ocorre que já somos mais de sete bilhões nessa esfera azul. Em algum momento a seleção darwiniana terá de entrar com força total. E vem outra questão fundamental, que só alimenta minha neurose: evidentemente, eu já nasci; pode-se dizer que cresci; reproduzi (e passei a entender a importância desse ensinamento central da época de escola); e... então a próxima etapa é a inominável? Socorro! Como assim? E todas as viagens, os cursos que ainda quero fazer, todos os planos, em que conta vão entrar?

Calma, como quase tudo o que é ensinado na escola, essa lógica é bem simplista. Dissecada ao máximo a ponto de ficar minimamente didático. Ufa! Então ainda posso fazer planos. Ou não! Melhor dizendo: acho que posso viver. Um dia de cada vez, lutando contra a feroz ansiedade que é minha companheira (e de boa parte das pessoas "modernas").

Encerro minha viagem fantástica ao mundo das caraminholas de minha cabeça com um pensamento tranquilizante: não precisamos abraçar o mundo com as pernas (sei, isso é brega, mas descreve bem). O importante é valorizar cada conquista, por menor que seja. E se você olhar só um pouco para trás, certamente já verá muitas. Seja um trabalho entregue no prazo, um carro comprado com suas economias ou ver o crescimento dos filhos. Cada uma dessas conquistas é combustível para novas. Descubro, por mais clichê que seja, que a felicidade é feita de momentos (brega!!).

E termino as últimas palavras com um esboço de sorriso. O diálogo com o marido foi catártico. Libertador. Tranquilizante. Posso dormir em paz! Amanhã, só amanhã, penso nas aulas de inglês ou alemão.

4 comentários:

  1. Adorei todo o texto, valeu pelas palavras gostei muito de "esboço de um sorriso" isso da uma crônica, SUCESSO PRA TI

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    1. Obrigada pela visita, Nilson. Fico feliz que tenha gostado. Sucesso a você também! Abraços.

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  2. Fantástico!!!Às vezes nossos sonhos vão flutuando em nossas mentes, que temos a impressão que estamos vivendo uma doce realidade!!

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