sábado, 10 de janeiro de 2015

A bagagem de Joana



Férias na praia! Joana vinha contando os dias para isso. Tirar a cabeça do trabalho, trocar a fria  paisagem de concreto pela ensolarada vista para o mar, sentindo a areia fininha sob seus pés. Fechou os olhos, imaginou os dias alegres que teria. Quinze dias de férias. Quinze dias para esquecer do mundo, para desligar-se de tudo. Deixou a felicidade invadir-lhe por um instante. Sentiu-se finalmente leve, após períodos de grande turbulência.

Os últimos meses não haviam sido fáceis. Fora promovida no trabalho, mas a enorme carga de responsabilidades provocou-lhe uma estafa. A falta de tempo quase fez ruir seu casamento, além de ter posto à prova sua sanidade. Recuperou-se após várias sessões de terapia, aliadas à prática de yoga e aulas de dança com o marido. Desistiu da promoção (e conseguiu, com muita luta, superar o sentimento de fracasso por conta disso), dedicou mais tempo para si e seu casamento. E marcou as benditas férias, depois de quase dois anos trabalhando sem descanso.

Joana abriu os olhos após o estado de transe. E avistou as malas sobre a cama, esperando para serem arrumadas. Viajaria dali a cinco horas. Todos os dias quando saía para o trabalho prometia que iria começar a arrumar as malas, mas sempre chegava exausta demais. Para ela, o ruim de viajar (que ela amava) era ter de lidar com as malas. Somente o fato de pensar no que levar, que tipos de roupas separar e como fazer para caber tudo dentro das malas já lhe causava sofrimento. Mas teria de fazer isso naquele momento, e teria de ser rápida.

Começou pelos biquínis. Pegou uma sacolinha onde guardava todos eles. Ficou indecisa sobre quantos e quais levar. Ficar trocando de biquínis todos os dias era um saco, pensou. Acabaria ficando cheia de marcas, o que ela não queria. Por fim, separou quatro biquínis e jogou-os na mala. Separou também quatro cangas, uma para cada biquíni. Depois, a vez das camisetas. Após tirar todas do armário, separou vinte delas. Dez shorts. Vestidos, muitos vestidos. E saias também. Pronto, tinha o básico para levar à praia, pensou.

Calçados. Separou chinelos, sandálias e rasteirinhas. Pronto, isso bastava. Então, olhou as suas botas. Joana as adorava. Se existia um item em seu closet que traduzia sua personalidade, era o seu par de botas. Como ela iria ficar quinze dias longe das botas? Mas, refletindo bem, quando e como ela iria usar botas em um calor de quase cinquenta graus (ok, um pouco de exagero, mas a sensação térmica estava próxima disso, ela vira na previsão do tempo)? Viveu um conflito interno de longos dois minutos e, por fim, pôs as botas na mala.

Enquanto pegava um chapéu para levar à praia, deu de cara com sua coleção de echarpes e lenços. Eles eram seus aliados para as frentes frias que enfrentava durante algumas épocas do ano. Eram seus queridinhos. Mas, novamente seu lado racional falando, como iria usar esses acessórios no calor escaldante? Ah, mas vai que chove granizo e a temperatura cai? Pegou alguns e os lançou na mala. Por via das dúvidas, separou também um casaquinho fininho, discreto, apenas para o caso de a temperatura cair um pouco. Melhor ser prevenida, oras!

Hora dos itens de higiene pessoal e cosméticos. Rapidamente, separou escova e creme dental, shampoo, condicionador, sabonete, desodorante e perfume. Filtro solar para o rosto, outro para o corpo, loção pós-sol, hidratante para o rosto, para o corpo, para as mãos e para os pés. E o cabelos? Praia deixa os cabelos pedindo socorro, então montou um Kit SOS Cabelos: filtro solar, creme para quando fosse entrar no mar, um leave-in para finalizar e uma máscara para emergências. Perfumes, faltava isso também. Pensou em levar apenas um perfume fresquinho, uma colônia que combinasse com praia e verão. Mas olhou sua prateleira de perfumes, com vários coffrets que ela adorava. Não era mulher de um cheiro só, como ela dizia. Pegou alguns dos pequenos frascos e os separou. Por fim, maquiagem. Praia não pede nada carregado, então levaria somente o básico: uma boa base, rímel, blush e batom. Mas, quando olhou sua maletinha de maquiagem, com diversas cores e pincéis, não resistiu. Separou-a também.

Para finalizar, acessórios como brincos, colares, pulseiras e cintos. Apesar de sua intenção em ser muito básica, cedeu ao impulso de levar várias de suas peças coloridas, para dar um up no visual. Excedeu em muito os quatro pares de brincos em que pensara inicialmente. Colares, pegou em torno de quinze. Mais algumas várias pulseiras e muitos cintos coloridos. E, claro, algumas bolsas extras, para dar uma variada. Além de sacolas de praia também.

Quando achou que havia terminado, Joana tentou, em vão, fechar as malas. Eram duas malas grandes, que, de tão abarrotadas, não fecharam de jeito algum. Joana tirou tudo de dentro novamente, tentou arrumar de um jeito que havia visto em um tutorial de arrumação, mas continuou sem conseguir fechar os zíperes. Sentou-se em cima das malas, socou-as para caber tudo, mas não teve êxito.

Cansada, suada e exausta, sentiu as lágrimas começarem a escorrer pelo rosto. Teria que tomar um rápido banho e correr para o aeroporto, onde encontraria o marido para embarcarem. E havia perdido para sua própria bagagem. Pegou o telefone e ligou para o marido, mas desligou após o segundo toque. Pensou em ligar para alguma amiga ou a mãe, apenas para desabafar. Por fim, desistiu. Não havia o que alguém pudesse fazer por ela naquela hora. Enxugou as lágrimas do rosto, tirou o suor da testa e retirou, novamente, tudo das malas. Começaria mais uma vez. Mas faria diferente.

Em cinco minutos, tinha, finalmente, a bagagem pronta. Deixou as duas enormes malas de lado e colocou tudo em uma mochila. Algumas camisetas, shorts, vestidos, roupas íntimas e biquíni. Ah, e o filtro solar, claro! Além de dois livros, companheiros das deliciosas horas de ócio. Decidira, ali, que viajaria leve. Quase sem bagagem. Precisava de muito pouco. E, se faltasse algo, poderia adquirir aonde fosse. Deixou todas as coisas que tinha separado antes sobre a cama e foi para o banho. Rapidamente se sentiu melhor. Mais aliviada, mais alegre, mais leve. Leve como sua bagagem agora. Leve como a vida deveria ser.

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